quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Uma Xícara de Chá


Chovia muito.
Sempre gostei da chuva. Acho que ela dá um clima nostálgico à vida.
Essa coisa de usar guarda-chuva, andar agasalhado, tomar um chá bem quente faz com que a vida pareça mais tranquila, afinal ninguém quer correr nesse tempo.
A expressão das pessoas quando estão num dia chuvoso é de paz, é de quem sabe que não adianta ter pressa, é a chuva que mostra pra gente que não temos o domínio de nada,  e não a meteorologia, pois ao planejar um dia ensolarado corremos o risco de terminarmos frustrados e ensopados.


Entrei na cafeteria sacudindo meu guarda-chuva, tirando a capa, o cachecol, e toda parafernália que eu compunha. Eu o avistei de longe, sentado na mesma cadeira, na mesma posição, o corpo curvado diante de uma xícara de café, seus olhos fixos na fumaça que saia do café como se dançassem na sua frente. Ele sempre olhava a vida assim, em tudo via cores, movimento, energia, esperança.  
Sentei de frente pra ele, pedi um chá de maçã, e eu encostei a minha mão na dele que estava largada sobre a mesa e soltei um tímido, tudo bem? Eu estava totalmente sem graça, nem o beijei.
Quando combinei nosso encontro, eu já tinha tudo planejado, diria que foi bom o tempo que passamos  juntos, que a culpa não era dele e que talvez no futuro a gente pudesse recomeçar e se entender, foram horas de ensaio, na verdade dias, no ônibus, no trabalho, e em diversos momentos em que eu tentava criar coragem pra falar e por diversas vezes me peguei falando sozinha e quando percebia que alguém me encara assustado, logo disfarçava e fingia um cantarolar encaixando minhas frases de término numa música sem melodia que eu inventava na hora, mas quando cheguei lá e dei de cara com ele com o rosto completamente desmanchado por uma tristeza que nem tentou disfarçar, afinal ele sabia exatamente minha intenção, pois eu também já não conseguia disfarçar minha insatisfação, deu-me  uma covardia por assim dizer e comecei a falar de assuntos que nada tinham a ver com a proposta do encontro, falei do tempo, reclamei da minha irmã, mostrei o arranhão no braço que ganhei numa queda em uma poça de água na minha vinda pra cá , em fim eu o torturei o mais que pude, mesmo sem querer, dando voltas e voltas. Percebi seus olhos marejados, porém nenhuma palavra atravessou seus lábios. Olha pra mim! Eu pedi.
Ele não olhou e molhou os lábios ressecados do inverno com um gole de café.
Você não dizer nada? Perguntei.
Ele subiu os olhou em “slow motion”, eram 48 quadros por segundo de pura mágoa, desceu a xícara de café e disse: - Parece que vai chover pra sempre.
Ele mordeu os lábios tentando impedir as próximas palavras e as primeiras de muitas lágrimas começaram a escorrer, e eu consegui entender perfeitamente a metáfora que ele usara para destruir toda a confiança que eu tinha demorado semanas para erguer.


Sou uma covarde ou uma esperançosa, talvez eu consiga me enganar durante mais um tempo, adiar foi à única forma que eu encontrei de resolver aquela situação com a qual eu ainda não conseguia lidar, os argumentos que ele usou durante nossa conversa na cafeteria me desarmaram completamente, não consegui confrontar alguém que me amava tanto, tanto por nós dois.
A chuva passou, mas os meus dramas permanecem.
Ainda estamos juntos, mas eu continuo sentindo que por dentro uma chuva fina e gelada encharca nossos corações.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Crônica de uma Noite Insone

Eu me reviro nessa cama fria tentando entender o que se passa no coração.
Me levanto e acendo um cigarro para relaxar, ponho meus cotovelos na janela e me debruço quase como quem quer se jogar, me inclinando cada vez mais, e a paisagem me olha de volta, me vigia, eu sinto como se algo lá fora pudesse ver o que tenho por dentro.
Era uma dor insuportável, uma inquietação que subia do estômago e que eu tentava segurar entre os dentes, enquanto a dor escorria pelos meus olhos derretidamente. Expulsei a fumaça dos meus pulmões, mas o que eu queria mesmo era expulsar essa dor. Sentia frio, mas mantive a janela aberta, apenas me retirei do penhasco covardemente. Mal apaguei um e já acendi outro cigarro.
Sentado na minha cadeira favorita, em frente a escrivaninha, peguei um caderno e ensaiei algumas palavras, mas não virou poema, nem verso, ficou meio sem sentido, e era exatamente isso, só mais um rabisco. Eu costumava me inspirar quando sofria de amor ou tinha alguma perda emocional, mas dessa vez era diferente, não sei explicar como e talvez por isso mesmo não tenha conseguido descrevê-la, talvez um desenho explicasse melhor, mas eu nunca fui um bom desenhista, até minha letra era péssima.
Enchi um copo de vodca e bebi num gole só, nem fiz cara feia. Eu sempre tinha uma garrafa no meu quarto para noites insones como esta que eram constantes em minha vida.
Fiquei ali algumas horas, misturando os pensamentos, e momento ou outro eu me desligava da minha dor e pensava em contas a pagar, nos compromissos da manhã, até soltei um sorriso quando lembrei das piadas sem graça do tio durante o jantar.
Coloquei uma música bem baixa, bem calma, bem triste. Voltei pra cama e fiquei ali parado, olhando ao redor, olhando pra dentro.
Perdi uma noite inteira, estou cheio de olheiras, com sono e não cheguei a conclusão nenhuma.



quarta-feira, 10 de julho de 2013

Fortaleza

Eu queria ser forte o bastante para ultrapassar os obstáculos sem sequer derramar uma única lágrima. Forte o suficiente para afastar do meu coração aquelas pessoas, lugares e lembranças que me machucam.
Queria ter forças para perguntar àqueles que me traíram quais foram as suas recompensas e se valeu mesmo a pena me deixar cicatrizes tão profundas.
Ser forte para mudar o mundo e para mudar a mim mesmo.
Forte para não me importar com o que as pessoas pensam.

Queria para arrancar do meu peito toda dor, toda a mágoa e todo o ressentimento acumulado.
Queria ser forte para saber perdoar quando preciso, mas para isso eu sei que é necessário ter mais que forças, é preciso ter sabedoria e paciência.

Mas também queria ter forças para não perdoar aqueles que amolecem o meu coração com suas palavras tão doces e tão falsas.

Queria ser forte para manter o meu sorriso mesmo quando o choro engasga na garganta e a vontade de sumir do mapa é tão grande que me sinto o menor homem do mundo.
Queria poder oscilar, vacilar de vez em quando sem me sentir um “fracote”.

Forte para a dor.
Forte para o amor.
Intocável, inquebrável, inesquecivelmente forte.
Porque neste mundo de lobos não há espaço para os fracos, para os sensíveis, para os humanos.
Talvez a maior força esteja dentro do meu coração que resiste ao complexo de superioridade e que se permite fracassar, sem o medo de ter que recomeçar.

Pois os fracos reconhecem a força, mas os que se acham “fortes” são incapazes de admitir suas fraquezas.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Verdades que machucam #01


Ele ficou parado um instante tentando entender os próprios pensamentos e balançava a cabeça como se  nada fizesse sentido e não fazia. Deixou cair lentamente de seus olhos lágrimas tão silenciosas e tão tristes que me doía só de ver e eu tentei abraça-lo, mas ele afastou-se bruscamente e fez um sinal de "stop" pra mim. Eu insisti, porque queria curar aquela dor que eu mesmo causei, mas não havia maneira fácil de fazer aquilo, não havia como romper sem sofrimento e eu já sabia disso, pois não era minha primeira vez, era a dele. Eu não soube como explicar, dei voltas no assunto e pela sala tentando convencê-lo de que a culpa era minha, e era mesmo, a culpa sempre é minha. Vai entender que ontem mesmo eu disse que gostava dele e hoje pela manhã quando acordei tive a certeza absoluta de que eu não o amava e talvez jamais o amasse. Deve ser meu ascendente, tão bipolar.
Eu fui muito romântico em todos os nossos momentos juntos e talvez tivesse deixado alguns sentimentos mais claros do que realmente eram, o fato é que eu nunca me apaixonei por ele, apenas fui me deixando levar pelas circunstâncias que nos cercavam. Eu estava carente e ele era carente. Foi um "prato cheio" para criar ilusões e desilusões. 
Teve um momento, um único, em que eu achei que talvez pudesse dar certo e essa esperança foi o nosso fim. Foi ontem quando ele chegou e me pegou de surpresas com um par de alianças de noivado, eu esqueci todos os defeitos dele e os meus também, joguei pro alto todos os meus argumentos de que nossa relação era nostálgica e sem graça, me senti num castelo, a euforia foi tão intensa que me joguei em seus braços e deixei a emoção me contagiar, nunca ninguém havia feito uma surpresa tão linda pra mim, foi quando eu disse que gostava dele, mas não disse o “Eu te amo" que ele tanto esperava, eu mesmo nem percebi, só pensei nisso hoje de manhã quando olhei para a minha mão direita e percebi o grande erro que nos dois estávamos cometendo, foi só nesse momento que eu resolvi por um ponto final em nosso pequeno romance. Coloquei a aliança em suas mãos, dei-lhe um beijo no rosto e disse "Seja feliz".

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Praticando a positividade!


Tem coisa mais gostosa nessa vida que entender que a felicidade consiste no prazer de estar aqui e agora fazendo parte da história? Não.

A minha felicidade não está nos livros de autoajuda apesar de ajudarem mesmo (já li vários), nem está no salário no fim do mês, apesar de muitas vezes ser o intermediador. Não é a beleza, nem o lugar, nem a outra pessoa, a felicidade mora aqui nos meus pulmões, no meu coração, dentro da minha cabeça.

Sou feliz quando respiro, sou feliz quando meu coração responde as minhas emoções, sou feliz quando consigo entender que eu não vou estar aqui pra sempre e não faço disso um drama, quero mais é aproveitar essa vida e tirar dela as experiências necessárias para o que talvez ainda me aguarde num outro plano.
Eu aprendi a sorrir sem motivo, a cuidar dos meus sentimentos para não se transformarem em ressentimentos, aprendi e continuo aprendendo que outro faz parte de mim e que todos nós estamos no mesmo barco e não podemos deixá-lo afundar. Sejamos reflexo do que queremos para nós.

Não estamos num tribunal, não precisamos julgar, nem nos sentir culpados, nada de clima pesado e tensão...
...Eu sei também não é só alegria, mas alguém me disse que precisamos conhecer a escuridão para dar valor a luz.

Faço o que posso e vou continuar me esforçando,  não para buscar a felicidade que nunca vou encontrar e sim para manter a felicidade que tenho.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

No escuro

Se amava tanto ao ponto de não aceitar a rejeição.
E foi essa mesma rejeição que impulsionou-a a viver como escória quando necessário fosse para prosseguir em seu objetivo involuntário de alimentar o próprio ego.
Suas lágrimas eram verdadeiras não há duvida alguma e suas angustias eram tão profundas que já se tornara parte de sua personalidade.
Vivia em função do amor que dissera sentir por um outro alguém, amava tanto ao ponto de renegar sua própria vida, história e família.
Amou tanto que esqueceu do alimento que seu corpo implorava para sobreviver, sobreviver para viver esse amor.
Passou dias dormindo porque em seus sonhos tudo era tão real e em seus sonhos todo amor era possível.
Não foi à praia, nem ao campo, nem a lugar nenhum desde que ficou doente do coração. Perdeu os sentidos. Já não via e nem ouvia.
Ainda bem que não pensou nisso, mas poderia morrer por esse amor se fosse preciso, mas não precisava, pois já estava a margem de uma vida.

Seu sorriso não saía do canto da boca, não se espalhava como antes, era superficial, era um aceno de mão ou uma forma de demonstrar que ali debaixo daquele entulho, o coração ainda respirava. Mal sabia que já não era mais amor e nem desconfiava que aquilo que sentia nem passava perto de um sentimento tão bom como este que supunha. Basta! Disse uma vez e outra e talvez uma centena, mas era um ímã. Vou embora e nunca mais volto! Afirmou, mas nem a própria acreditou em si. Seria uma pobre alma se tivesse uma, porém o que restara foi apenas um corpo atraído por outro corpo que não podia mais ser seu.
E viveu assim durante tanto tempo, no escuro, que perdeu as contas do tempo que perdera achando que sentia algo que hoje já não faz o menor sentido.



quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Banho de Chuva



Caminhou até a chuva, caminhou lentamente como quem entra num palco para dizer poucas palavras e chegando lá gritou tudo o que sua alma sentia. E eu parei para assistir mesmo sabendo que não podia. Uma consciência muda e ao mesmo tempo gritante. Ela, assim como sua casa, era rodeada de mistério. Eu como sempre, curioso e medroso, oscilei na decisão de ficar mais um pouquinho e ver no que iria dar.


Ela, assim de repente, atravessou sua porta e se apossou da chuva e fundiu-se com ela e reteve consigo cada gota que caia ao seu encontro. Era o mundo inteiro no seu quintal. Ficou rapidamente parcialmente despida, enquanto seus cabelos tornavam-se ainda mais lindos e negros à medida que ficavam ainda mais molhados. Ela dançava como se houvesse uma música vibrante e jogou seus joelhos no chão com muita força, mas não sentiu dor, eu vi isso no seu rosto. Acariciou seu corpo como quem procurava por prazer, ela estava totalmente em transe, seus olhos nada fitavam.




Trêmulo, mesmo segurando o guarda-chuva eu já estava completamente ensopado, mas isso não me preocupou. A chuva forte deu lugar a uma fina chuva gelada.


Pensei em tirá-la dali, mas eu jamais seria capaz de uma atitude tão corajosa naquela época. Queria evitar um pouco aquela humilhação, e eu tive medo que alguém tentasse agredi-la, ainda pior, tentasse faze-la parar, ela não merecia e eu também não. Indiretamente era ela que me humilhava esfregando na minha cara toda a sua coragem e independência. Pensei em dançar junto com ela e me juntar àquela loucura, dentro de mim era o que mais queria.


Nem sei por quanto tempo eu a observei. Tive vergonha do desejo que senti e também senti medo do que eu sentia. Mordia meus lábios de desejo e ansiedade.


Toda a vizinhança se aproximava aos poucos, e eu ali escondido entre a esquina e o portão dela observava paralelamente ora os vizinhos, ora a deusa da chuva.


As mulheres acompanhadas que se aproximavam batiam em seus homens que não conseguiam controlar seus olhos sedentos daquela mulher, as mulheres então tentavam em vão tampar os olhos daqueles lobos famintos. Eu podia ver no rosto delas ruborizado de moral, algumas aos cochichos e outras em seus gritos e ofensas declaradas, um pouquinho de inveja daquela mulher que parecia ter fugido da prisão em que nós, seres humanos, nos encontrávamos.


Fui passando, tinha que ir embora por mais que eu não quisesse, e eu comecei a vê-la em quadros, enquanto passava pelas estacas de madeira que formavam o cercado em volta da casa dela. Muita gente começou a se aproximar do portão, mas do que nunca era hora de ir embora. Nunca soube o desfecho.


Cheguei a minha casa e o comentário era absoluto, a notícia chegou antes de mim, não paravam de falar da vizinha devassa, apenas eu fiquei em silêncio. Durante o jantar parei a colher de sopa em frente ao meu rosto como se tivesse paralisado, lembrei-me da cena, mas fui interrompido por minha mãe que me deu uma tapinha nas costas perguntando se estava tudo bem. Respondi assustado, quase engasgando, que sim e voltei a tomar a sopa quente, não tão quente quanto ela. A chuva passou.


Fui pra cama após o jantar e fechei os olhos tentando enxergá-la mais uma vez. Eu a vi apenas por alguns minutos e já estava completamente apaixonado. Nunca a beijei, nem a toquei, eu tinha apenas quinze anos e aquela tinha sido a minha primeira paixão, paixão por aquele banho de chuva.


Sofria como um louco. Ninguém nunca soube da minha tristeza até esse momento. Passava pelo portão dela todos os dias e ficava torcendo para que chovesse novamente, mas para aumentar minha angústia, foi um dos outonos mais secos de que eu me lembro.


Ela nunca mais saiu de casa e a vizinhança nada comentava. Eu tinha medo de perguntar. Meses depois eu ouvi alguns homens conversando na frente do bar e descobri que ela havia se mudado no dia seguinte ao temporal e que toda a minha expectativa tinha sido em vão. Era como se uma faca tivesse atravessassado meu peito, agora vazio. Cheguei a minha casa chorando, mas não expliquei a ninguém meus motivos. Dei uma desculpa qualquer.




Desde então, sempre que chove cai uma gotinha dela em mim e eu abro a boca morrendo de sede, morrendo de saudades da minha primeira paixão.
         
               

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